segunda-feira, 27 de junho de 2011

A TREPADEIRA >> Kika Coutinho

Na crônica do dia.

Se o amor fosse uma planta, ele seria uma trepadeira. Você conhece essa espécie. Digo a planta, não o amor.

Ela cresce apoiada em algo. Ela precisa de suporte para crescer e buscar a luz. E é isso que faz o amor.

Eu aprendi tendo filhos, não sabia antes, mas aprendi. O amor não cresce sozinho. Jamais seria uma samambaia, uma rosa, uma tulipa. Ele não precisa só de água e sol. Há quem tente assim. Há quem trate o danado tal qual um vaso de hortênsia. Lindo, colorido. Cuida-se, com carinho. Rega-se, põe no sol. Há quem converse com o amor. E ele cresce, desponta em rosa, azul, amarelo. Fica lindo por algum tempo. O amor tratado como um vaso tem sua data de validade impressa, pode ser longo, dar frutos, mas morre e, de algum jeito, aproveitamos o vasinho.

Já o amor construído, esse de tijolo em tijolo, esse, o prático e real, é o tal amor eterno, do tipo Tarcísio Meira e Gloria Menezes, Nicette Bruno e Paulo Goulart, o do seu vizinho, ou daquele seu tio. O amor que nos disseram ser o da Branca de Neve, esse, sinto muito, só se crescer como a trepadeira.

A trepadeira busca a luz, mas precisa estar apoiada em algo. Como o amor, ela pode crescer para sempre, se tiver uma parede que a leve em direção ao sol. E não é assim que construímos relações felizes? Ora você será a parede, ora a planta, mas terá de ter alguém para se escorar, e alguém onde possa se apoiar. É preciso ser forte juntos, é preciso encontrar a mesma luminosidade e, palmo a palmo, de mãos dadas, caminhar em direção a ela.

Os bebês fazem isso muito bem. As mães acham que os amam loucamente, que os ensinam a crescer e que os formam como pessoas. Mas é num instante, quando uma pequena criança toma um tombo e mostra todo o seu amor e veneração pela mãe, esticando os bracinhos, que nos damos conta: Ele me ama! Pobre bebê, não sabe que não faço ideia do que estou fazendo, não sabe que tenho tantos medos e inseguranças, não sabe que como chocolate escondido, que devo ao banco, que estou com gastrite, mas não se importa. Escora-se em mim e, em busca do que para ele é a luz, cresce. Apoia-se na parede firme que sou e fica mais forte, mais seguro e mais feliz. Quando nos damos conta, somos nós, frágeis e inseguras, que nos apoiamos na segurança deles: parece que levam tanto jeito para pegar a colher sozinhos, ou para dar um passo sem apoio, deixemos. E lá estão eles, nossos filhos e filhos do mundo, sendo a nossa parede firme, onde crescemos e os libertamos, ave rara e forte. Voe meu amor, voe em direção à luz, somos, aqui, parede ou planta, frieza ou natureza, não importa.

Quando nos damos conta, construímos o amor, sem muita façanha, sem adubos miraculosos ou sem truques cansativos. Quando nos damos conta, foi o tempo, a parede, a luz, que fizeram o trabalho, e lá está a planta, sem planos de parar, tornando infinito e belo o que era só banal.

Fonte: Crônica do Dia

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